sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Primeiro de abril de 1966 - Sonhos e aventuras se misturam...


Amigos

Sinceramente nao sei bem por onde começar. Entao vou fazer como a maioria faz. Começar pelo começo.

Nasci no interior do Parana. O meu nascimento foi algo no mínimo interessante. Era primeiro de abril. Minha mãe comecou a ter contrações no final da madrugada. Ainda no clarear do dia meu pai arreiou o cavalo e saiu em busca de uma parteira. Triste destino... dia da mentira no interior não é fácil! Principalmente para um homem como meu pai. Sempre gostou de "pegar" os seus amigos na "história" de primeiro de abril. Naquele dia ele teria de provar que não se tratava de uma brincadeira. Bem, a primeira
parteira não acreditou... pelo que sei da história, foi adiante e conseguiu convencer uma segunda. Ela veio e ajudou no meu nascimento.

Na foto,eu sou o carinha da direita. Acho que eu tinha quase um aninho. Mais uma prova que gordinho é sempre simpático. O "nervosinho" é meu mano Tonhão.

O lugar onde nasci é chamado pela distancia da próxima cidade. Km 20. Muito comum se ouvir por lá até os dias atuais... -Vamos pro vinte? Nao.. hoje não dá, vou jogar bola no 15.! Meus primos moravam no km 30. Seguidamente pegávamos o lotação e iamos até o 30 para passar o final de semana com eles. Digo, nós, pois comigo sempre estava meu irmão mais velho... o da foto. conhecido na época, por Nêne ou Toninho. Cada viagem do 20 para o 30 era uma pequena aventura... quando chovia não tinha condução. Neste caso, faziamos a pé , algumas vezes.

Minha infancia foi naquele lugar e la era meu mundo. Até então, pouco sabia sobre o que havia fora do 20.

Nossas aventuras da época restringiam-se em pescar, caçar, jogar futebol, fazer taipa no córrego criando assim um lugar para brincar na agua. Tinhamos nossas tarefas domésticas. Meu pai além de agricultor, era criador de porcos. Chegou a ter 40 matrizes(porcas criadeiras) de uma só vez. Então, vocês podem imaginar quanto porco de engorda ele tinha... algumas centenas. Meu irmão e eu éramos responsáveis pela limpeza dos chiqueiros. Logo que chegávamos da escola, depois do almoço, começava o batente que só parava mesmo, ao anoitecer. Mas entre uma tarefa e outra, tinhamos tempo de sonhar... como era bom sonhar!!!

Quando haviam jogos, ouviamos o "Grenal" (Internacional e Gremio de Porto Alegre) pela Rádio Guaiba. A noite captávamos rádios de ondas longas e gostávamos de ouvir o programa " A turma da maré mansa" do Rio de Janeiro. Aos 4 anos de idade, lembro do povinho da vila do Km 20, vibrar com os gols do Brasil na copa de 70. Pelé, Tostão, Rivelino, Carlos Alberto Torres, Jairzinho, entre outros so conheciamos de ouvir os jogos, fervorasamente narrados pelas Rádios Gauchas... Destas audiçoes de futebol nasceu um garoto locutor. Eu narrava tudo o que estava acontecendo por perto, e para amplificar o som usava o funil de abastecimento do forrageiro (máquina de fazer quirera)... aliás, rádio, sempre foi minha paixão! Infelizmente, o máximo que consegui realizar foi gravar algumas participacoes num programa católico na adolescência e mais tarde tive algumas poucas gravaçoes na rádio HCJB que tem sede em Quito no Equador, e os programas em português, são gravados num Estudio em Curitiba.
Em 1970 foi a primeira copa televisionada no Brasil... mas ninguem tinha TV por lá. Em 1974, na copa do mundo da Alemanha, ja pudemos ver alguns jogos pela televisão do Bar do Nildo... que também funcionava como uma parada de onibus para os viajantes do picadão. Unica estrada da epoca ligando Francisco Beltrão a Cascavel no sudoeste/oeste paranaense.

Nosso sitio estava debaixo da rota de vôos Sao Paulo - Foz de Iguaçu. Os aviões passavam duas ou três vezes na semana. A gente observava lá de baixo... ver um avião passando era sempre um acontecimento festivo... Eu ficava imaginando, será que algum dia eu voaria num deles?! Ah.. como sonhar me fazia bem...voar, voar... sonhos, não só de Icaro!!!

Meu pai, depois de algumas consecutivas safras perdidas e aliados a outros efeitos colaterais de estiagem ou chuvas em demasia, somadas a crise economica que o Brasil "sempre" enfrentou, precisou vender o sitio e mudamos para a cidade.
Enfrentamos muitas dificuldades. Graças ao bondoso Deus só não passamos fome. A profissão de meu pai sempre fora agricultor. Mas herdei dele a audácia em enfrentar desafios e começar algo novo. Juntou algum dinheiro e comprou um caminhão C50 a gasolina. Aos 10 anos dirigi pela primeira vez. Minha alegria era ir para o "campo" com ele. Lá, podia dirigir o dia todo o caminhão C50, carregando lenha cortada e levando ate o carregadouro. Onde os caminhães maiores transportavam a lenha até a fábrica de óleo vegetais que abrira próximo dali. O dia começava as 4 horas da manha para a gente e só chegávamos em casa as 10 horas da noite. Ele e eu, estávamos muito juntos na labuta. Em tempos de escola, trabalhava com ele por meio periodo.
Dependendo da distancia do local da extração, carregávamos e transportávamos até 5 cargas destas, como na foto acima, num só dia.
Nos intervalos da vida, da luta, do cansaço e da dor... haviam os sonhos. Ah! como sonhar era bom... meus sonhos sempre tiveram tela de muitas dezenas de polegadas e com HDTV. Meus sonhos eram claros, definidos, especificos... meus sonhos eram parte do real... sonhar era o que mantinha viva a brasa da esperança dentro da vida de um garoto da roça...!!! Sonhar não me custava sequer um centavo!!! O meu sonho continha inicio, meio e fim.
Cada sonho, cada momento vivido, cada lembrança ou fantasia teve importante participação na formação do meu caráter e personalidade... olho para trás e digo: valeu a pena!


Obrigado por você, que leu até o final. Se gostou, logo terá um outro capitulo.

Abraços

Celso

2 comentários:

  1. E o garoto sonhador chegou longe, muito longe....
    Bjkas, adorei a tua estória de vida.
    Eliane

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  2. Muito legal, essa parte do "20" eu não vivi, mas qtas e qtas histórias poderáimos escrever de nossa infância no interior.. Saudades de vcs, me emocionei ao ler !!!

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